Aldeia global by Fernando Ilharco
"Há quarenta anos, McLuhan, antecipou que quanto mais as extensões electrónicas penetrassem as actividades humanas, mais os novos media - que são hoje as dezenas de canais de televisão 24 horas por dia na casa de cada um, a Internet e os telefones móveis - se desenvolvessem, mais nos afastaríamos da linearidade e da lógica sequencial do texto escrito e mais nos aproximaríamos, ou antes, regressaríamos a uma era instantânea, emocional e tribal de envolvimento sensorial total. Por isso a aldeia global, noção introduzida ao grande público em 1962 na obra "A Galáxia de Gutenberg", era e é uma aldeia e não uma cidade. A metáfora fala-nos, indica-nos, sugere-nos a aldeia global, não a cidade global. E de alguma forma, intuitivamente, a expressão aldeia global é de facto sentida por nós como mais apropriada para caracterizar os tempos que correm do que a de cidade global. E em que é que uma aldeia é diferente de uma cidade? Ou antes, colocando as coisas no modo e no tempo contemporâneo, em que é que as cidades cosmopolitas de hoje, a rede global das cidades, se assemelha a uma aldeia? Por estranho que pareça, o que assemelha o mundo global de hoje a uma aldeia é o acesso à mesma informação: hoje as televisões generalistas e as redes globais audiovisuais das histórias de choque instantâneas e simultâneas; ontem, o pregoeiro público, o homem que percorria a aldeia ou que subia à sua torre mais alta, gritando e apregoando as histórias, os factos e os eventos que os seus habitantes deveriam saber. Na aldeia todos tinham acesso à mesma informação, a uma informação que a todos chegava, e à qual ninguém podia verdadeiramente reagir - o pregoeiro fixava a agenda. Hoje, o pregoeiro público é a televisão, as televisões generalistas, cuja força assenta precisamente não na informação que transmitem mas no facto daquilo que apregoam ser o que todos vêem, ouvem e sentem. É esta a aldeia global. Um local emocional, acústico, simultâneo, de participação e envolvimento constante. "
Fernando Ilharco (in Jornal Público, 11-03-2003)
Fernando Ilharco (in Jornal Público, 11-03-2003)
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