Há uns anos a Time propôs a eleição da figura do século. O mais votado a uma dada altura era... Kemal Ataturk, o "pai" do nacionalismo turco. Notem
um apelo que na altura estava a ser feito...
Acabei por não saber qual a evolução da votação, mas era óbvio que os turcos se haviam mobilizado para votar em massa no seu amado ex-lider. No final
ganhou Einstein o "Person of the Century"; é interessante notar como na categoria de "líderes e revolucionários" a "poll" final junto do público de facto
colocava Churchill com uma vitória à tangente sobre Ataturk...
Tudo isto para fazer o paralelo com o "nosso" (salvo seja) Salazar. Em primeiro lugar, podem-se de facto tentar encontrar semelhanças e diferenças entre tais personagens: ambos considerados "salvadores da Pátria" a uma dada altura; ambos líderes autoritários; ambos responsáveis directos e/ou indirectos pela morte de outros -embora aqui acho que a palavra "assassino" aplicada a Salazar seja historica e juridicamente "exagerada". Cada vida aliás é preciosa, mas algo que se costuma dizer que separa os líderes fascistas Salazar de outros que tais como Franco, Mussolini e Hitler é de facto a situação do primeiro ter sido proporcionalmente muito mais "brando". Embora insisto, cada vida é preciosa de per se; e além disso: pode não se matar mas destruír a vida de uma pessoa, como Salazar fez comprovadamente a milhares de seres humanos. Mas voltando a Ataturk: é de notar o paralelo isso sim mais com Hitler e Staline, com o tristemente famoso e controverso genocídio dos arménios, e já agora das comunidades gragas que viviam na Anatólia.
Voltando então ao nosso caso concreto, como se devem lembrar, a lista original da RTP (que acho que funcionava mais como uma lista de "sugestões") excluia Salazar, o que levou a uma grande polémica e a duas consequências:
- a mobilização dos apoiadores de Salazar;
- a inclusão posterior do nome dele na lista de sugestões, o que obviamente aumentou a sua visibilidade.
Ao mesmo tempo pelos blogues percebe-se que a RTP tem "receio" que "Salazar" ganhe, e sendo assim não me admira que isso tenha um perverso efeito catalizador no sentido de mais pessoas votarem nele: quer os verdadeiros apoiantes de Salazar (e aqui, em democracia, há que permitir que as pessoas manifestem a sua preferência por ele, tanto mais que houve um grupo de pessoas, talvez assim não tão pequeno como isso, que beneficiou
de facto com o seu regime; e assim deve haver tanto direito de escolher Salazar como Cunhal, sendo que a preferência por Cunhal também gera "anti-corpos"), quer aqueles que se querem divertir um pouco com a brincadeira de mau gosto que seria Salazar ganhar o concurso...
Dito isto, acho que as coisas valem o que valem, especialmente neste tipo de votações a €0.60 por sms... Quando andava na Faculdade havia um programa chamado "Agora escolha" e inúmeras vezes havia que escolher entre um episódio do "Barco do Amor" e o "Espaço 1999". Para mim, isso nem implicava uma "escolha", pela minha lógica a decisão só poderia ser uma. E lá vinha eu a correr para casa para ver mais um episódio em que o Capitão Koenig certamente iria encontrar mais uma maneira inteligente e engenhosa de prolongar por mais um pouco a improvável e lunática viagem dos habitantes da Base Alpha pelo oceano sideral só para verificar que... os telespectadores tinham preferido as trivialidades fúteis daquile navio de cruzeiro... Mas pronto, era aborrecido e frustrante, mas isso nunca tornou o Love Boat melhor que o Space 1999.
Ou seja: mesmo que o Salazar ganhe, so what? Certamente que o Ataturk também NÃO FOI a segunda personalidade política do século XX.
Alberto Terego Etiquetas: Opinião